Sorry, Baby

Direção —

Gêneros —

Ano — 2025

Sorry, Baby (2025) é um filme desordenadamente honesto: em meio aos traumas do passado, nossa heroína encontra espaço para a esperança de um futuro melhor.

Filmes como Sorry, Baby (2025) são como diários. Digo isso não pela intimidade que o filme trabalha, mas, sim, pela maneira como a diretora conduz a história. Esse é o primeiro longa-metragem que Eva Victor assina como diretora e roteirista, além de ser a protagonista. Com isso, esse é um filme que se desenrola como uma varredura em um jornal íntimo: você avança e retrocede no tempo, procurando os detalhes mais chamativos e improváveis sobre aquela pessoa. O interessante não é fazer lógica dessa invasão de privacidade, mas esbarrar nos detalhes que compõem aquele indivíduo. Por vezes, as fofocas são boas, mas, em outros momentos, uma caixa de monstros pode pular em você. Em Sorry, Baby, Eva Victor entrega um filme que discorre desordenadamente sobre a vida de uma jovem: em meio aos traumas do passado, nossa heroína encontra espaço para a esperança de um futuro melhor. 

No filme, Agnes (Eva Victor) é uma professora de literatura em uma faculdade da Nova Inglaterra. Solitária, ela vive em uma zona rural cercada pelo silêncio, tendo somente seu gato como companhia. Quando Lydie (Naomi Ackie), uma amiga de Nova York que está grávida, faz uma visita e as duas reencontram antigos colegas da faculdade, memórias se reacendem. Entre lembranças e conversas, Agnes recorda Preston Decker (Louis Cancelmi), seu orientador do mestrado, cuja relação passou de admiração para um episódio de violência sexual. Tentando lidar com os eventos, Agnes, sem apoio institucional e mergulhada em um estado de torpor emocional, acolhe um gato abandonado e inicia uma relação com o vizinho Gavin (Lucas Hedges). Entre as salas de aula e os reencontros carregados, ela busca recuperar sua voz e os motivos para seguir em frente. 

O filme começa dando o seu tom que mistura crônica com intimidade. Quando Lydie chega à casa de Agnes, as duas amigas passam um tempo no sofá, conversando sobre caras e pintos. Essa cena é simples, mas eficiente quando se pensa na construção de intimidade que obras como essa — que vão abordar assuntos delicados — deveriam priorizar. O filme conta com diversos momentos como esse, que, além de serem catalisadores de sinceridade, permitem que os personagens aflorem. Nesse sentido, tanto Agnes quanto Lydie são adultas, mas agem como crianças: elas são brincalhonas e, por mais que uma delas esteja grávida, elas ainda têm medo do que fazer com uma criança. Por fim, a maturidade vem no final do filme, quando Agnes toma conta do filho de Lydie e dá conselhos a ele. Nisso, a maturidade não é cuidar de um bebê, mas compreender que a vida é, em poucas palavras, uma merda. 

Esse é o primeiro filme com Eva Victor na direção e a assinatura da cineasta já parece sólida. Além dos vários momentos em que a diretora prioriza conversas íntimas a dinâmicas visuais de montagem, existe uma sequência, em específico, bastante sofisticada. Já era entendido que o orientador de Agnes, Preston, tinha um interesse sexual nela. Certo dia, ele a convida à sua casa para discutir a dissertação dela. Nesse momento, em vez de Victor tentar capturar os detalhes do assédio, só vemos a casa por fora. Em seguida, você sabe o que aconteceu pela forma como Agnes sai da casa de Preston, mas não consegue ter certeza. Nisso, Victor canaliza uma sequência da jovem dirigindo em silêncio, o que apenas acumula tensão. Por fim, um outro plano-sequência de Agnes na banheira, relatando o ocorrido para Lydie, não é só catártico, mas também uma prova do êxito de Victor como atriz e realizadora. 

O filme, além da natureza diarística, carrega a responsabilidade de denúncia. Embora essa responsabilidade seja genuinamente bem intencionada, por vezes pode parecer mal calibrada. Digo isso pensando na cena em que Agnes vai ao médico no dia seguinte ao estupro e quando ela conversa com duas responsáveis da universidade. Enquanto o doutor faz perguntas indelicadas sobre o ocorrido, as duas mulheres dizem que não podem fazer nada contra Preston porque ele já havia se demitido. O ponto em questão é o que o filme parece mais ridicularizar o médico e as duas advogadas ao ponto de fazer parecer que o problema são eles e não propriamente o sistema que instrui esses profissionais a colocarem praticidade acima do acolhimento. Não digo que a denúncia não é importante, longe disso, mas o filme não parece culpar as pessoas certas pelas falhas maiores. 

Enquanto assistia Sorry, Baby, lembranças de Manchester à Beira-Mar (2016) vieram à mente. Penso que seja pela fotografia que, embora seja teoricamente fria, acaba gerando mais conforto do que afastamento. Isso, em conjunto com a dinâmica de trechos recortados fora de uma ordem cronológica, ajuda no equilíbrio em que personagens secundários têm potência narrativa, mas não ao ponto de serem mais importantes do que deveriam: Natasha (Kelly McCormack) é uma colega invejosa de mestrado de Agnes que confessa ter transado com Preston por puro interesse, mas ele não correspondeu com as expectativas dela — isso desencadeia uma crise de ansiedade em Agnes. Com isso, Sorry, Baby é um filme que passa uma sutil sensação de leveza, mas que não mede palavras nos momentos mais pesados. Existem traumas do passado, mas, acima de tudo, uma esperança de um futuro melhor.

(Nota: Este texto foi publicado originalmente no site Cinemanorama e, desde setembro de 2025, encontra-se também disponível no site Suborno.)

Sorry, Baby

Título Original: Sorry, Baby

Diretor:

Lançamento: 2025

Duração: 104 mins.

Gênero(s):

Classificação: 16

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