Comecei a ver The Baltimorons sem saber nada sobre ele. Nenhuma crítica, nenhum trailer, nenhuma sinopse, apenas um pôster que chamou minha atenção. Talvez tenha sido essa ausência de expectativas que me permitiu descobrir um filme tão sincero. A obra é uma comédia romântica natalina em que cada interação dos protagonistas parece verdadeira devido à hesitação nas atitudes desses personagens. É como se eles ainda não soubessem o que vão fazer diante da câmera e simplesmente se deixassem levar pelo improviso. Jay Duplass dirige o longa deixando claras as influências de Antes do Amanhecer e The Holdovers, valendo-se principalmente de uma condução singela e da valorização dos diálogos como âmago da narrativa. Porém, ao contrário dos dois filmes citados, também se percebe uma forte influência da comédia de improviso, onde o timing da entrega das falas é tão importante quanto seu conteúdo, e é justamente por essa confiança no acaso que a comédia se torna maior que o comum ao seu escopo indie.
No filme, acompanhamos Cliff, um ex-comediante de improviso que tenta se recuperar do alcoolismo após uma tentativa de suicídio. Sóbrio há seis meses, ele acaba no consultório da única dentista disposta a atendê-lo na véspera de Natal, num encontro que logo os levará a uma noite divertida e improvável pelas ruas de Baltimore. Cliff é um homem de trinta e poucos anos, dividido entre o conforto da estabilidade e o desejo por uma vida mais autêntica, e Michael Strassner o interpreta com um humor contínuo que nunca soa saturado ou insistente, mérito do carisma natural do ator. Didi, por outro lado, é uma dentista divorciada que já é avó e vê a vida com um cinismo que contrasta com a delicadeza tão comum às personagens femininas do gênero. Ela resiste às investidas de Cliff e faz com que a química entre os dois nasça dessa negociação constante de limites e gestos de confiança mútua, formando um casal que ameniza o peso da solidão ao se encontrarem um no outro. É um romance improvável de ir adiante, e talvez por isso mesmo pareça tão genuíno.
Entretanto, em meio à cativante troca entre eles, surge Brittany, noiva de Cliff, que adiciona camadas morais incômodas à obra. Ela monitora a localização do celular do parceiro, mas isso nunca é usado como justificativa para os atos dele, que invariavelmente irão reverberar sobre essa mulher que, mesmo sem apoiar seus sonhos, o aguarda pacientemente para passar o Natal juntos. Consequentemente, o romance dos protagonistas se desenrola em um cenário moralmente ambíguo: sabemos que Cliff não é tão feliz ao lado de Brittany, mas também compreendemos que não seria justo relegar Didi ao papel de amante, ainda mais considerando o quanto ela sofreu quando o ex-marido a traiu. Nenhum dos três é vilanizado ou reduzido a arquétipos fáceis, são apenas pessoas presas a um impasse ético que o filme não tenta resolver. Ainda que a trama seja simples, ela se fortalece por essa recusa de julgamentos e contribui para que possamos abraçar as contradições dos personagens com empatia.
O diretor entende que a comédia não precisa se prender a punchlines; por isso, segue uma lógica inversa, na qual o humor surge de interrupções, de interações inesperadas e de uma certa dose de autodepreciação que trata o riso como uma resposta à dor e uma forma de contê-la. Nos momentos cômicos, as piadas funcionam como válvula de escape para as frustrações e limitações dos personagens, proporcionando alívio em vez de distração. Duplass compreende que humor e melancolia podem coexistir sem que um anule o outro, e confia plenamente na sensibilidade de seus atores para encontrar esse equilíbrio tonal. Assim, a direção valoriza a cumplicidade entre os olhares dos intérpretes e potencializa os momentos de pausa, e é por essa transparência que o improviso consegue expor sutilezas e vulnerabilidades que um roteiro rígido jamais poderia.
The Baltimorons trata de recaídas e recomeços, do medo de decepcionar os outros e a si mesmo, e interpreta a sobriedade como uma negociação constante com o passado. É engraçado quando pode, triste quando deve e, sobretudo, humano. Ao final, fica a sensação de termos visto um filme simples, mas verdadeiro, com uma sensibilidade tão profunda que é impossível terminá-lo sem um sorriso no rosto. Ainda que não se trate de um novo clássico natalino, é o tipo de obra que renova nossa fé no cinema pela delicadeza com que filma dois desconhecidos se encontrando por acaso, numa noite aleatória. Conduzido com uma naturalidade admirável, é uma pequena pérola que pede para ser redescoberta todo ano por quem topar passar uma véspera de Natal na companhia de personagens falhos e plausíveis, capazes de nos relembrar a beleza comovente das imperfeições.